Sala de Ensaios C1

Olhei-o. Por momentos, tive vontade de mandar o controle às couves e fazê-lo perceber o que ele ainda me fazia sentir. Quis fazê-lo entender os motivos que eu tinha para achar que ele tinha todas as razões para me achar uma doida varrida. Mas se eu fizesse aquilo em que estava a pensar... Aí sim ele ficaria com uma opinião errada acerca de mim. E, no mínimo, nunca mais quereria olhar para a minha cara.

Não, eu tinha de tirar aquilo da cabeça. Se eu o fizesse não havia volta a dar depois e... As coisas acabariam por correr mal. Iria tudo correr mal, ele ia reagir mal.
Não havia nada que estivesse a funcionar coerentemente na minha mente, naquela altura do campeonato. Um dos meus lados emocionais torcia para que eu arriscasse, o outro dizia-me para ter cuidado pois poderia sofrer à séria se tivesse a brilhante ideia de me atirar de cabeça. Mas, afinal, eu iria sofrer de qualquer forma, ou não? Por isso, mais valia que o fizesse entender-me. Apesar de saber que isso seria impossível porque não havia uma alminha, excepto a da minha mãe, que me conseguisse perceber e ao meu coração idiota.
Continuei a olhar para ele e suspirei antes de me aproximar, devagar. Iria dar-lhe sempre a hipótese de fugir de mim.

Fiquei só a olhar para ele, esperando que reagisse. Se ele quisesse, se ele também tivesse a mesma vontade que eu, de certeza que seria ele a avançar porque... Eu não era capaz.
Sentia as pernas tremerem...
O que fazia eu agora? Deixava-me levar? Beijava-o eu? E se... E se ele não quisesse, se depois me parasse e dissesse que eu era louca por estar a fazer aquilo? Ou esperava que ele tomasse a iniciativa? Se ele tivesse gostado de mim também era o que faria, ou não?

Tive vontade de fechar os olhos ao sentir o toque dele.
Durante anos, tinha divagado, fantasiado aquele primeiro encontro, como estaria o meu príncipe, se também iria gostar de mim, achar-me bonita, dizer-me coisas queridas, dar-me carinhos até se cansar ou passar as noites comigo debaixo do céu a ver as estrelas, dando o meu nome a cada uma delas. Ao longo de 12 anos eu pensara em como seria ouvi-lo a chamar-me de princesa, sentir o seu abraço quando estivesse triste ou apenas porque tal lhe desse na vontade, a dizer que me amaria para o resto da vida e a levar-me àquela mesma praia onde eu encontrara a sua fotografia todos os anos quando chegasse o Dia dos Namorados. Tinha pensado em tanta coisa, mas ao conhecê-lo finalmente, ao saber que ele estava ali tão perto, que era real e não apenas um sonho meu, descobrira que aqueles desejos eram apenas isso. Desejos. Que mesmo que nunca se viessem a realizar, eu ficaria feliz se pudesse, ao menos, tê-lo do meu lado. Se pudesse, um dia, dizer-lhe o que sentia sem ter medo de uma nega da sua parte.
Deixei, então, que os meus olhos se fechassem de vez. Um arrepio percorreu o meu corpo, impulsionando os meus lábios a procurar os seus.

Era descabido pensar que tinha tido tanto medo de o beijar há uns segundos atrás. Mais descabido ainda era pensar que esperara tanto tempo para beijar um rapaz pela primeira vez. Se ele soubesse daquilo... Que vergonha.
No entanto, valera a pena cada segundo da minha vida que eu esperara. Tinha valido tudo a pena só para descobrir como era bom poder provar os lábios dele... Do meu príncipe encantado. Tinha sido bom cada minuto só para sentir o toque daquela sua boca na minha, o quão lentamente elas se moviam em conjunto para nos deixar apreciar cada instante.
Eu tinha tido receio sim, todo o receio do mundo. Mas esse receio havia-se desfeito em pó no instante em que aqueles seus olhos haviam olhado nos meus e me pedido para confiar... No instante em que os lábios dele tinham procurado os meus, em resposta.