Sala de Ensaios C1

- Não estou a gozar mas essa foto é mesmo minha, eu sou capaz de ter uma cópia, se quiseres mostro-te, não te estou a mentir - disse-lhe, sem tirar os olhos dos dela.
Se não tivesse a certeza não estava a dizer aquilo. Era uma loucura, mas era verdade, era eu quem estava naquela foto, era eu em miúdo. O sorriso ainda era parecido com o meu, as minhas faces estavam agora mais duras, mas continuavam a sobrar alguns traços que eu preservava desde criança.

E, de subito, o meu sonho, todo aquele conto de fadas, pareceu morrer. Era essa a razao de eu sentir o que sentia, de o meu mundo parecer entrar numa especie de paragem iminente quando eu estava perto dele. Era ele sim. Olhando para a foto e comparando cada traxo das duas figuras, isso era mais do que um facto visivel. So eu era burra demais para nao o ter percebido mais cedo. Aquela era a explicaxao plausivel para eu ter... Amado aquela cara dele desde o inicio.
- Ee... Eu...
Desviei o olhar na direccao do soalho, chocada. Sempre imaginara aquele encontro como um sonho tornado realidade. Entao, agora... Porque raio me sentia tao... Envergonhada?

Devolvi-lhe a foto, pegando na mão dela e pousando-a sobre a mesma.
- Podes ficar com ela, se ainda a quiseres - disse, corando ligeiramente ao dizer aquilo.

Ainda bem que, naquela altura, eu estava a olhar para o chao porque senti os olhos inundarem-se de lagrimas, e nao consegui fazer nada para evita-lo. Nao. Eu nao ia chorar. Nao por causa de uma estupidez daquelas, nao por um rapaz que mal conhecia. E depois se toda a vida eu tinha sonhado com aquele dia? E depois se eu tinha vivido 12 anos em busca do principe encantado daquela fotografia e afinal ele nem sequer existia, a nao ser nos meus sonhos? E dai se... Se eu nao passava de uma burra e uma estupida que ainda tinha pensado que, se aquele rapaz existisse mesmo, alguma vez veria algo em mim? Sim. Eu era imensamente burra.

- Agora que sabes que sou eu deve ter perdido o seu encanto - disse coçando a nuca e fazendo uma careta embaraçada. - Se calhar preferias não saber...
Ela devia achar que eu me tinha tornado um idiota. Ela podia ter-me achado fofinho, porque naquela altura em tinha 5 anos, agora devia achar-me um imbecil.
Ainda por cima eu não sabia falar com ela... O que é que eu havia de dizer?! Se falasse corria o risco de ela me achar um grande falhado, não podia correr esse risco. Se ela achasse que eu era mesmo um falhado nunca mais iria falar comigo.

Pus um dedo no seu queixo e levantei-lho, para que olhasse para mim, assim que baixou a cabeça para o chão.
A minha intenção não era deixá-la assim, a balbuciar. Na verdade eu não sei qual era a minha intenção, mas não a queria naquele estado, queria que ela conseguisse fala comigo. Se eu não fosse cusco ao ponto de lhe ter perguntado sobre a foto aquilo não estava a acontecer. Agora ia conseguir que ela se afastasse de mim. Ela queria ir embora dali a correr, provavelmente era demasiado bem educada para mo dizer.

Nao conseguia falar, dizer nada coerente. Apesar de eu pensar que o que havia descoberto iria mudar tudo, o facto eh que, olhando nos olhos de Heath, descobrira que tal coisa era impossivel: Eu continuava a ama-lo. Inevitavelmente. Nao conseguia sentir o contrario. Por mais que o quisesse.

Sorri-lhe suavemente, em vez de lhe dizer que estava à vontade. Não dizem que um sorriso vale mais que 1000 palavras?! A verdade é que olhar para ela assim, atrapalhada, não me dava vontade de fazer outra coisa se não sorrir. Era adorável e por isso era inevitável não lhe sorrir daquela maneira.

- Des... Desculpa...
Eu era uma parva isso sim. So podia se-lo. Nao podia gostar dele daquela forma, tal nao fazia o menor sentido. Senti-me tremer, apreciando somente o seu toque no meu queixo.

- Vá, deixa lá isso... - disse-lhe meio embaraçado.
O que é que se fazia quando estas coisas aconteciam? Como é que eu haveria de saber se nunca antes me tinha acontecido algo tão... tão improvável de acontecer! Estaria eu a agir correctamente? Ou devia deixá-la fugir a correr? Não, claro que não a ia deixar fugir a correr. Tinha de lhe mostrar que não era assim tão mau. Se calhar podia fazer com que as suas expectativas à cerca de mim estivessem correctas.

Acenei, simplesmente, sem o olhar. Nao suportava a ideia de ter feito tamanha figura de estupida.
- Eh m... Melhor eu ir...
Sim, era mesmo. As lagrimas ameaxavam chegar a qualquer instante e nao queria que ele as visse. Nao queria que ele me achasse ainda mais idiota.

- Não! - disse de imediato, tirando o dedo do seu queixo e levando a mão à nuca, sem saber muito bem o que dizer. - Eu não sou assim tão mau, é só agora... que não... que não me conheces bem - disse, com o sorriso a desfazer-se e a dar lugar a uma expressão de total desembaraço.

Ele? Mas... Quem disse que o problema era ele?
- Eu... Nao. Nao es tu. S... Sou eu, percebes? Sou eu.

- És tu o quê, Jaymelin? - perguntei sem perceber.
Ela estava a insinuar que ela era o problema? As raparigas tinham o hábito de dizer isso... Mas eu não conseguia perceber o porquê... o porquê de ela achar que havia alguma coisa de errado com ela.

- Porque é que dizes que és o problema? - perguntei olhando-a novamente nos olhos.
Encostei-me a uma mesa com um espelho.

- Porque eh a verdade...
E era. Eu era a parva ali, que se tinha apaixonado por ele de uma forma estupida. Como lhe dizia eu isso? Que nao havia mudado nada? Simplesmente, eu nao era capaz de o fazer. Nao ia faze lo.

- Claro que não é verdade! - disse levantando-me outra vez para ficar mais em frente para ela.
Continuava a achar incrível ela estar a dizer aquilo, ela não era o problema, claro que não era o problema!

- Quem cometeu a maior estupidez aqui fui eu, Heath. Não tu.
Olhei-o nos olhos ao vê-lo aproximar-se.

- Que estupidez? Não cometeste nenhuma estupidez, Jaymelin! - disse, com toda a certeza daquilo.

Dei por mim a olhar para o chão com vergonha daquilo. Agora ela tinha ficado a pensar que eu achava que ela me devia um pedido de desculpas?! Sim, porque só pede desculpa quem acha que a outra pessoa merece um... Ela estava a desculpar-se por não ter feito nada!
- Não me peças desculpa quando não em fizeste nada - disse abrindo-me num sorriso.

- Não, não! Jamais pensaria isso de ti! - garanti-lhe sem deixar de sorrir.
Não queria mesmo nada que aquilo ficasse constrangedor entre nós. Eu gostava de estar ali ao pé dela, ela era o meu tipo de rapariga. Não era como aquelas raparigas que forçavam as coisas, ela parecia ser ela própria comigo e eu gostava de raparigas assim.